A equipe da Brasiliana Iconográfica selecionou obras de seu acervo que revelam, no século XIX, uma cidade pacata, diferente da metrópole industrial que se tornou no século XX e da megalópole de hoje.
A imagem acima, o Panorama da Cidade de São Paulo, é uma das obras mais importantes da iconografia paulistana do século XIX. É o primeiro panorama completo da cidade e uma das poucas representações de São Paulo anteriores à criação da fotografia. A obra, encomendada por d. Pedro I, foi pintada pelo artista francês Arnaud Julien Pallière. O panorama de 36 x 97cm foi feito com base em uma aquarela preparatória, produzida às margens do Rio Tamanduateí. Mostra, no primeiro plano, o rio, a várzea do Carmo (onde hoje se encontra o terminal de ônibus Parque Dom Pedro), e uma ponte de madeira conhecida como Ponte do Meio. A partir dela, vê-se a ponte e a ladeira que levam ao convento do Carmo (atual Av. Rangel Pestana) e à torre da antiga Catedral da Sé. No centro da imagem, a torre da igreja dos jesuítas no Pateo do Collegio e, mais à direita, a casa da marquesa de Santos. Na extrema direita, localiza-se o antigo edifício do Mosteiro de São Bento, remodelado no início do século XX.
Na pintura do artista francês, fica evidente a relação da cidade com o Rio Tamanduateí, de grande importância comercial, por ser utilizado para o transporte de mercadorias e abastecimento da região. Por esse motivo, o Mercado Municipal está instalado às margens do Rio, no lugar onde se localizava o Mercado dos Caipiras. Hoje, o Tamanduateí perdeu seu curso original, ficando mais reto e canalizado.
Além da arquitetura e geografia da época, a pintura de Pallière mostra, no primeiro plano, um grupo de tropeiros. Vários artistas viajantes representaram esses habitantes da cidade com seus trajes típicos, mas foi Charles Landseer quem os registrou em maior quantidade – cerca de uma dúzia de desenhos – e com mais detalhes. Entre os anos de 1825 e 1826, o jovem inglês veio ao Brasil como artista oficial da missão diplomática britânica, comandada pelo embaixador Sir Charles Stuart. Landseer passou dez meses no Brasil, a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, mas também visitou e registrou os estados de São Paulo, Pernambuco, Bahia, Santa Catarina e Espírito Santo.
Até mais da metade do século XIX, São Paulo era uma cidade pequena, com menos de 50 ruas e pouco mais de 20 mil habitantes. A atividade urbana limitava-se ao chamado Triângulo Histórico, formado pelas ruas São Bento, Direita e Quinze de Novembro. Em Viagem pelo Brasil 1817-1820, um dos mais importantes relatos sobre o Brasil do século XIX, os naturalistas alemães Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philipp von Martius descreveram a cidade assim: ""Acha-se a cidade de São Paulo situada numa elevação na extensa planície de Piratininga. A arquitetura de suas casas amiúde com sacadas de gradil, que ainda não desapareceram por aqui, como no Rio, indica mais de um século de existência; contudo, as ruas são muito largas, claras e asseadas, e as casas têm, na maioria, dois pavimentos. Aqui raramente se constrói com tijolo, ainda menos com cantaria: levantam-se as paredes com duas filas de fortes postes ou varame entrelaçado, entre os quais se calca o barro (casa de taipa), sistema muito parecido com o pisé francês"".
Em 1840, São Paulo possuía alguns edifícios significativos, como a Academia de Direito, os conventos de São Francisco e São Bento e o Palácio do Governo, mas continuava cercada por chácaras e sítios. Somente em 1892 o Viaduto do Chá, o primeiro de São Paulo, foi inaugurado. O projeto, criado com o objetivo de facilitar a travessia do Vale do Anhangabaú e permitir a expansão da cidade em direção à Praça da República (o centro novo), foi idealizado pelo empresário, arquiteto e litógrafo francês Jules Martin.
Martin foi responsável também pela impressão de mapas detalhados de São Paulo. Em sua oficina litográfica, a primeira da cidade, produziu várias peças gráficas, como São Paulo Antigo e São Paulo Moderno, voltadas à promoção do crescimento urbano e econômico vivido pela cidade desde o fim do século XIX.