O jovem Franz Joseph Frühbeck (1795-?) teve a chance de viajar como assistente de bibliotecário no navio D. João VI, que trouxe a princesa Leopoldina (1797-1826) ao Brasil em 1817. São dele os únicos registros iconográficos dessa travessia marítima de 85 dias, que saiu do Porto de Livorno, na Itália, em 15 de agosto, e chegou ao Rio de Janeiro em 5 de novembro. Frühbeck não era bibliotecário nem artista, mas seu entusiasmo e desejo de aventura colocaram seu nome na história.
O jovem austríaco tinha 22 anos quando fez a viagem. Antes disso, havia trabalhado como caixeiro-viajante, o que teria despertado nele "um renovado desejo de conhecer países diferentes e neles colher experiências", como conta em seu relato de viagem, publicado em Viena em 1830, e só traduzido no Brasil em 2017, numa parceria do Museu Histórico Nacional com o Instituto Oldemburg de Desenvolvimento (In: FRÜHBECK, Franz Joseph. Viagem ao Brasil. Camera Books). Tudo leva a crer que conseguiu o posto de assistente do bibliotecário Roque Schüch (1788-1844) graças à sua tia-avó, a condessa Nanny von Künsburg, que era dama de Leopoldina.
Além de anotações no diário, Frühbeck, apesar de não ter formação em Belas Artes, começou a fazer desenhos e aquarelas retratando a embarcação, os tripulantes, as vistas do navio e, mais tarde, algumas cenas do Rio de Janeiro. Abaixo, podemos ver o navio D. João VI, o salão comunitário, marinheiros em pausa para o almoço e pássaros.
Pouco antes de chegarem ao Brasil, os viajantes enfrentaram uma violenta tempestade. "Tudo que poderíamos imaginar em termos de um cenário de horror, acabou por acontecer", descreve Frühbeck. As violentas ondas distanciaram os três navios que compunham a comitiva, o D. João VI, o navio português São Sebastião e a fragata Augusta, que trazia cientistas e artistas da Missão Austríaca. Os três navios se reencontraram em alto-mar apenas alguns dias depois, e, em 4 de novembro, avistaram terra. "Ao perguntar em qual região nos encontrávamos, recebi como resposta que se tratava do promontório brasileiro de Cabo Frio", conta o jovem, que registrou o local no desenho abaixo.
A chegada ao Rio de Janeiro se deu no dia seguinte. Como conta Frühbeck, Dom Pedro (1798-1834) subiu ao navio para conhecer pessoalmente a esposa, com quem havia se casado por procuração. Mas deixou Leopoldina no navio e foi dormir em terra firme. O solene desembarque da princesa, no dia 6 de novembro de 1817, foi registrado por Frühbeck (abaixo) de maneira mais simples que outra obra desse momento histórico, a do francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848).
A mesma simplicidade nos traços e o colorido dos desenhos marcam também outras obras que integram o álbum de Frühbeck, pertencentes ao acervo do Instituto Moreira Salles, e que podem ser vistas aqui na Brasiliana Iconográfica, como o Passeio Público ou a Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro (os dois abaixo).
Frühbeck ficou sete meses no Rio de Janeiro, durante os quais ele procurou se informar "a propósito de tudo que era digno de ser visto", segundo ele, ainda enfrentando o calor e o pouco tempo livre que lhe sobrava para se dedicar a sua obra. Retornou para a Europa em 1818, a bordo do navio São Sebastião. Já na Áustria, tornou-se comerciante e se casou em 1819.
Somente em 1829 e 1830, expôs seus desenhos e aquarelas em Viena. O sucesso das exposições o levou a publicar o relato, tão ingênuo quanto suas obras, e no qual não esconde sua ambição: "Agora, queiram se certificar de que meu desejo vem a ser este: garantir vossa satisfação, considerando-a como o objetivo final de minha felicidade. Esta será a divisa a me acompanhar sempre na viagem, adoçando todas as dificuldades e que me moveu também a apresentá-la objetivamente, em pinturas bem interessantes, altamente originais e jamais vistas".