O desenhista, fotógrafo, cartógrafo e engenheiro alemão Franz Keller-Leuzinger (1835-1890) foi um dos primeiros viajantes que se lançaram na profunda Amazônia para ajudar a incorporar essa parte do país ao Império. Ele chegou ao Brasil em 1856, aos 21 anos, na companhia de seu irmão, Ferdinand Keller (1842-1922), e de seu pai, o também engenheiro Joseph Keller, que fora convidado por dom Pedro II para dirigir a construção das primeiras ferrovias brasileiras.
Entre 1862 e 1867, os Kellers fizeram levantamentos no Rio Paraíba, na região entre Campo Belo e Barra do Piraí; nos vales dos rios Paraíba e Pomba, nos rios Iguaçu, Paranapanema e Tibagi, todos no Sudeste e parte do Sul do país. Esses trabalhos resultaram em relatórios detalhados, publicados pelo Ministério da Agricultura.
Keller não apenas descreveu os rios e acidentes geográficos da região, mas também desenhou mapas e fez relatos, a pedido do então Ministro da Agricultura, Jesuíno Marcondes de Sá (1827-1903), sobre as populações indígenas que encontrou por ali, como os Kaingangs e os Guarani-Kaiowás.
Nessas expedições, Keller registrou ainda aspectos da fauna e da flora, da população e da paisagem em desenhos e aquarelas. Podemos ver alguns deles aqui na Brasiliana Iconográfica.
No Rio de Janeiro, em 1860, Keller assumiu a direção do departamento fotográfico da Casa Leuzinger, do impressor e livreiro George Leuzinger (1813-1892). Alguns anos depois, casou-se com a filha dele, Sabine Christine (1842-1915), e passou a adotar o sobrenome do sogro, assinando Keller-Leuzinger.
Em 1867, ele e seu pai receberam um pedido do governo imperial para realizar um estudo para melhorar a navegação nos rios Amazonas e Madeira, em sua parte cheia de cachoeiras, e para a construção de uma ferrovia ao longo do Rio Madeira, no vale do Amazonas. Resultou daí o primeiro estudo que daria as bases para a construção da Ferrovia Madeira-Mamoré, apelidada de ferrovia do diabo.
Ele e seu pai partiram do Rio de Janeiro em novembro de 1867, subindo pela costa até chegar ao Pará. De lá, seguiram para Manaus, onde começou a expedição pelo Rio Amazonas até chegar ao Mamoré, onde hoje está o estado de Rondônia.
Keller-Leuzinger voltou ao Rio de Janeiro em janeiro de 1869 e publicou o “Relatório da Exploração do Rio Madeira na parte compreendida entre a cachoeira de Santo Antônio e a barra do Mamoré”, assinado por ele e seu pai, documento sempre citado nos trabalhos posteriores sobre a ferrovia.
Essa obra malograda ganhou o apelido de ferrovia do diabo pela dificuldade de construí-la. A intenção era que ela pudesse escoar a borracha colhida na região, e que na época era muito valorizada. Abatido pela malária, Franz Keller-Leuzinger não pôde participar do projeto de construção da ferrovia, assinado em 1877 com os americanos Philips e Thomas Collins. Devido às dificuldades da construção, os Collins faliram dois anos depois. Outro americano deu continuidade ao projeto entre 1907 e 1912, quando a ferrovia foi inaugurada. Mas ela se mostrou útil e lucrativa durante apenas dois anos, já que a borracha perdeu seu valor com a concorrência dos asiáticos, levando também à falência o segundo construtor. Hoje, só se vê trechos e maquinários abandonados.
Mas foi essa expedição que tornou Keller-Leuzinger famoso. Em 1873, ele voltou à Alemanha para tratar da saúde e lá, no ano seguinte, publicou o livro Vom Amazonas und Madeira, com anotações, desenhos e aquarelas. Ainda em 1874, foi publicada uma edição inglesa e, em 1875, uma norte-americana. O livro tem sete capítulos, um anexo e um mapa. Os dois primeiros fazem o relato da viagem, com base no relatório publicado em 1869. Nos capítulos seguintes, o autor faz observações sobre a vida das populações indígenas do Vale do Madeira e a catequese dos jesuítas.
O desenhista ainda quis voltar a trabalhar no Brasil, mas não conseguiu dar continuidade a seus projetos. Morreu em Munique, na Alemanha, em 1890.