A capitania do Espírito Santo conseguiu perdurar apesar de sua localização singular, espremida entre as principais capitanias do Império: Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. No início do século 18, com a descoberta de ouro no interior de seu território, acabou perdendo parte dele para a então criada Minas Gerais e durante muitos anos foi subordinada à da Bahia.
Terra dos Botocudos e de outros povos indígenas temidos pelos portugueses, a capitania do Espírito Santo foi primeiro colonizada por jesuítas que por muitos anos estabeleceram ali aldeamentos, deixando na região uma grande população de indígenas “aculturados”, como o retratado no desenho abaixo, do artista inglês Charles Landseer (1799-1879). Os jesuítas foram expulsos do território pela coroa em 1759.
Até o início do século XIX, o Espírito Santo foi uma área pouco habitada e explorada do Brasil. Em 1815, o príncipe alemão Maximiliam zu Wied -Neuwied (1782-1867) foi o primeiro estrangeiro a se aventurar em uma viagem do Rio de Janeiro ao Espírito Santo por terra, percurso que costumava ser feito de barco. Além de ser um longo trajeto pela areia, beirando o mar, a ameaça dos temidos indígenas que ainda ocupavam e lutavam por seus territórios era o tempo todo presente. Neuwied passou pelo Quartel de Barreiras, Itapemirim, Benevente, Guarapari, Vila Velha, Vitória, Barra do Jucu, Araçatiba, Nova Almeida, Barra do Riacho, Rio Doce, Linhares e São Mateus. Ele descreveu o percurso e todas essas localidades com detalhes no livro que viria a publicar em 1820, já de volta à Alemanha.
A gravura abaixo, de Neuwied, mostra a vista do monte Jucutuara, próximo à cidade de Vitória.
Sobre a cidade, o príncipe escreveu em seu Viagem ao Brasil nos anos de1815 a 1817 (NEUWIED, Maximiliano Príncipe de Wied, Companhia Editora Nacional, 1940): "Além de vários conventos, há uma igreja, quatro capelas e um hospital. A cidade é, entretanto, um tanto morta, e os visitantes, sendo raros, são objeto de grande curiosidade. O comércio marítimo não é desprezível; por isso, diversas embarcações estão sempre aí ancoradas, e fragatas podem aportar na cidade. As fazendas vizinhas produzem muito açúcar, farinha de mandioca, arroz, bananas, e outros artigos que são exportados ao longo da costa. Vários fortes protegem a entrada do belo rio Espírito Santo: um logo na foz; o segundo, construído de pedra, um pouco acima, com oito canhões de ferro; e ainda um pouco mais acima, numa colina entre o último e a cidade; e um terceiro forte com dezessete a dezoito canhões, alguns dos quais de bronze. A cidade está edificada um tanto desigualmente, sobre colinas aprazíveis, e o rio, que lhe passa atrás, corre entre altas encostas, em parte rochosas e em muitos lugares nuas e cobertas de liquens. A bela superfície do grande rio é semeada de numerosas ilhas verdejantes, e a vista, onde quer que lhe siga o curso através da região, encontra sempre um pouso ameno em altaneiras e fragrantes montanhas vestidas pela mataria".
Charles Landseer, que esteve no Espírito Santo cerca de dez anos depois, em 1826, também fez seu registro da cidade de Vitória no desenho abaixo. Entre a visita de Neuwied e a de Landseer, a capitania do Espírito Santo foi promovida a província.
Landseer, que viajou de navio do Rio de Janeiro até lá, não deixou nenhum relato escrito, mas registrou a costa da província e também a região próxima a Itapemirim em seus desenhos.
“A Vila de Itapemirim está apenas em formação, mas o nome que tem, e que em guarani significa pequena pedra chata, foi dado a seu território pelos índios, provavelmente mesmo antes do descobrimento do Brasil (...) É possível que nesta parte tivesse havido choças de índios ou cabanas de portugueses. Somente em 1811 foi que se deu a Itapemirim o título pomposo de Vila”, escreveu outro viajante que fez praticamente o mesmo percurso por terra que Neuwied, cerca de um ano depois do príncipe alemão (SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem ao Espírito Santo e Rio Doce, Editora Itatiaia; Ed. da Universidade de São Paulo, 1974). O botânico francês Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853), que esteve no Brasil entre 1816 e 1822, não deixou desenhos ou gravuras retratando suas viagens, mas um relato também minucioso que até hoje é referência para os estudiosos da história do Brasil.