Os povos indígenas do Brasil lutam pelo direito às suas terras desde a chegada dos colonizadores. A etnia puri era um povo nômade que se espalhava por toda a região Sudeste, principalmente no Vale do Paraíba e às margens do Rio Paraíba do Sul. Ao longo dos séculos, os puris foram obrigados a se refugiar cada vez mais no interior para fugir das doenças, das guerras e da destruição da natureza que chegavam junto com os europeus.
Na segunda metade do século XVI, ocorrem os registros dos primeiros contatos dos colonizadores com essa etnia, considerada por eles "selvagem" ou "braba". Enquanto pôde, esse povo resistiu à catequização, aos trabalhos forçados e aos aldeamentos. À medida que a região do Vale do Paraíba foi sendo tomada pela cultura do café e se tornando cada vez mais importante economicamente, os puris foram se espalhando e se dispersando. No início do século XIX, alguns viajantes tiveram contato com eles.
A gravura acima faz parte da edição italiana do livro Viagem ao Brasil nos anos de 1815 a 1817, escrito pelo príncipe alemão Maximiliano Alexandre Felipe (1782-1867), conhecido como Wied Neuwied, a partir das anotações e desenhos que fez durante seu percurso, e publicado originalmente em Frankfurt em dois volumes, em 1820 e 1821. O príncipe percorreu os atuais estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia. Esteve com os puris nas proximidades do aldeamento de São Fidélis, fundado em 1781 por capuchinhos italianos, às margens do Rio Paraíba do Sul, no norte do Rio de Janeiro e habitado principalmente por indígenas das etnias coroado e coropó. Depois de visitar o aldeamento, o príncipe fez questão de conhecer os "selvagens puris" na floresta.
Após o impacto do encontro inicial, o príncipe acompanhou os indígenas até o local onde ficavam suas cabanas, "as mais primitivas do mundo" na sua visão. "Os índios abandonam tais moradas sem saudades, quando a região circunvizinha não mais lhes garante alimentos suficientes; deslocam-se então para outros lugares, onde encontrem maior abundância de macacos, porcos, veados, pacas, cotias e outras caças", escreve o príncipe.
Na gravura acima, o arco e as flechas utilizados para caçar e a cesta onde levavam tanto mantimentos como as crianças em seus deslocamentos constantes. Alguns anos depois, outro príncipe, o da Prússia, Adalbert Heinrich Wilhelm (1811-1873), também registraria uma cabana do povo puri, em 1842 (abaixo), na mesma região visitada por seu antecessor.
Na década de 1830, o povo puri começou a desaparecer dos documentos oficiais do Império e depois foi considerado extinto. A miscigenação forçada e nem sempre real levava a registrar os indígenas daquela região como pardos ou "caboclos". Era uma maneira de o governo tomar as terras, a essa altura muito valorizadas, sem precisar dar grandes satisfações. Com o tempo, os puris tiveram que se adaptar ao novo modelo de vida imposto a eles, ainda que muitos preservassem costumes herdados de seus ancestrais.
Tanto que, mais de um século depois, na década de 1980, começaram a aparecer indivíduos e grupos que se autodenominam puris e movimentos de resgate da língua, dança e tradições que se perpetuaram pela cultura oral. No último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), realizado em 2010, 675 pessoas que vivem em São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e, principalmente, Minas Gerais, se autodeclararam puri.