Novas imagens da cidade de Salvador, na Bahia, entraram neste portal com a inclusão de uma edição colorida das gravuras feitas a partir das fotografias de Victor Frond (1821-1881) para o livro Brasil Pitoresco, escrito pelo jornalista Charles Ribeyrolles (1812-1860) e publicado em edição bilíngue, em 1861, na França. Os dois republicanos franceses tiveram o apoio financeiro do monarca D. Pedro II (1825-1891) para realizar o livro, que pretendia passar aos europeus uma imagem moderna do Brasil.
A obra traz ainda retratos da família imperial, panoramas do Rio de Janeiro e paisagens rurais no interior fluminense, com imagens dos trabalhadores escravizados das fazendas de café e açúcar. No texto, que foi publicado em três volumes, o jornalista discorre sobre a história do Brasil, desde o descobrimento e a colonização até a organização política do Império, além de comentar sobre a cidade do Rio de Janeiro e a vida de proprietários, escravizados e imigrantes nas fazendas.
As gravuras de Salvador mostram principalmente uma cidade europeizada, com foco em edifícios que misturam a arquitetura barroca com a neoclássica, e bem poucos habitantes. Entretanto, no primeiro censo realizado no Brasil, em 1872, pouco mais de 20 anos depois que essas imagens foram produzidas, Salvador era a segunda maior cidade do Império em termos populacionais, com cerca de 130 mil habitantes, e perdia apenas para a então capital, o Rio de Janeiro.
Ribeyrolles pretendia escrever mais um volume do livro dedicado a Bahia e Pernambuco, mas acabou morrendo antes de concluí-lo. Ainda assim, no pequeno trecho em que discorre sobre a capital baiana, Ribeyrolles destaca os aspectos europeus da cidade: "Com seu florão de soberania a Bahia não perdeu todos os antigos privilégios: ela é ainda a metrópole religiosa do Brasil, tem numerosos estabelecimentos científicos, uma rica biblioteca, um passeio público bastante belo e cômodo, alguns palácios e importantes escolas de cirurgia medicina e teologia, de artes e ofícios".
O teatro de São João da Bahia (acima), que também era conhecido como Grand Théâtre da Bahia, pela influência cultural que os franceses exerciam no Brasil do século XIX, foi um dos edifícios escolhidos para serem retratados no livro. Repare que as poucas pessoas que aparecem nas proximidades do teatro são bem-vestidas e brancas. Construído a partir de 1806 e inaugurado em 1812, foi um dos principais locais de entretenimento durante o segundo Império e funcionava onde hoje é a praça Castro Alves, mas foi destruído por um incêndio em 1923.
A capela anglicana do Campo Grande (acima), construída em 1853, também não existe mais. O templo com fachada em estilo neoclássico foi demolido em 1975. Em 1810, a partir de um acordo comercial entre a Inglaterra e Portugal, os cultos protestantes passaram a ser tolerados no Brasil, ministrados em inglês e assistidos somente por estrangeiros, primeiro em suas residências e depois na capela.
O prédio do antigo Colégio dos Jesuítas (acima), no Terreiro de Jesus, que funcionou de 1553 a 1759, também foi retratado. Depois da expulsão dos jesuítas, o prédio foi ocupado, em 1808, pela Escola de Cirurgia da Bahia, a primeira instituição de ensino superior do Brasil. Quando foi fotografado por Frond, por volta de 1858, o edifício já havia passado por uma reforma que trouxe à sua fachada novos elementos do estilo neoclássico e funcionava, desde 1832, como a Faculdade de Medicina da Bahia. Interessante observar na gravura, entre os poucos passantes, os fotógrafos em destaque diante do edifício, com seus equipamentos.
Na elegante casa particular (acima), mulheres e homens bem-vestidos conversam nas varandas e na frente da residência. Apenas um homem negro, carregando pacotes, aparece na imagem, feita provavelmente para reforçar o aspecto aprazível que "na cidade alta se adormece nos prazeres ou se deleita em chácaras deliciosas esparsas no declive do cabo', como descreveu Ribeyrolles.
A mesma população formada por famílias brancas com roupa de domingo, homens de cartola e mulheres de chapéu, pode ser observada no passeio público (acima), com seu obelisco a D. João VI no alto, inaugurado em 1815. Nessa Salvador idealizada por franceses, a Praça da Piedade (abaixo), um dos locais mais centrais e populares da cidade, onde em 1799 foram executados os líderes da Revolta dos Alfaiates, aparece como um espaço praticamente despovoado. Sem falar na Igreja de Nosso Senhor do Bonfim (abaixo), finalizada em 1772, no alto de uma colina deserta.