Pouco se sabe sobre a vida e a formação do artista francês Nicolas (Iluchar) Desmons (1803-1864) antes de sua chegada no Brasil em 1840, a bordo do navio Rapide. “A Polícia da Corte, correspondente à polícia de migração dos dias atuais, assim o descreveu: Nicolas Hushar Desmons, 37 anos, solteiro, litógrafo, cabelos castanhos, olhos azuis. Na lista de passageiros publicada no Jornal do Commercio é omitido o nome Hushar, publicando-se apenas Nicolas Desmons”, escreveu o pesquisador Julio Reis em seu artigo “Nicolas Desmons: revisão historiográfica do artista conhecido até então como Iluchar Desmons”(19&20, Rio de Janeiro, v. XV, n. 2, jul.-dez. 2020).

Panorama da cidade de Rio de Janeiro

O artista, conhecido como Iluchar Desmons devido a “um equívoco de interpretação da grafia, pois a letra ‘H’(de Hushar) foi confundida com a letra ‘i’ maiúscula seguida da letra ‘l’”, segundo o pesquisador, ficou famoso por seu álbum Panorama de la Ville de Rio de Janeiro, com 13 vistas da cidade, publicado pela Oficina Lemercier, da França, entre 1854 e 1856. As gravuras foram desenhadas “a voo de pássaro” (do alto) e a partir da natureza, como anota o autor no canto esquerdo das ilustrações, junto a seu nome, diferenciando-se de outros panoramas que naquela época já eram feitos a partir de daguerreótipos (fotografias).

Panorama da cidade de Rio de Janeiro

Em suas vistas do Rio, desenhadas do alto de morros da cidade, alguns que não existem mais, como o de Santo Antônio e o do Castelo, Desmons destaca na maioria delas, em primeiro plano, habitantes da capital, muitos deles negros, interagindo em grupos que parecem ser famílias com crianças, como nas gravuras acima. Também retrata mulheres brancas e negras com crianças, todas bem-vestidas, no Passeio Público (abaixo).

Panorama da cidade de Rio de Janeiro

Em 1842, pouco depois de se instalar no Rio de Janeiro, o artista passou a oferecer aulas de desenho em seu ateliê conforme anúncio publicado no Jornal do Commercio: “Na Rua do Hospício, número 103, e Rua da Glória, Desmons, professor de desenho, se propõe a dar lições da sua arte, e oferece-se aos Srs. Diretores de colégios e chefes de família; seu método de ensino é claro e objetivo, fazendo em pouco tempo rápidos progressos nos seus discípulos”.

Desmons mudou muitas vezes de ateliê, ensinou também em escolas e promoveu, a partir de 1863, “um curso de paisagem no Brasil, sendo, provavelmente, um dos primeiros a oferecer algo tão específico relacionado ao gênero”, escreveu a pesquisadora Elaine Dias, organizadora do livro Artistas franceses no Rio de Janeiro (1840-1884). Das Exposições Gerais da Academia Imperial de Belas Artes aos ateliês privados. Fontes primárias, bibliográficas e visuais (Prefácio: Jacques Leenhardt. Guarulhos: EFLCH-UNIFESP, 2020).

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O artista, que se apresentava nos anúncios que publicava como Desmons, desenhista artístico ou industrial, retratista, pintor de ornatos de salões e interiores de casas, figura nos catálogos das Exposições Gerais da Academia Imperial de Belas Artes (Aiba) de 1859 e 1860 e participou também da Exposição Artística de 1862 realizada no Paço Imperial.

Panorama da cidade de Rio de Janeiro

Morador do bairro de Laranjeiras e casado, Desmons morreu no Rio de Janeiro e foi enterrado no cemitério São João Batista, em 1864. Segundo o pesquisador Julio Reis, o atestado de óbito do artista foi encontrado na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. “Até a descoberta deste documento na Santa Casa, alguns autores acreditavam que o artista havia retornado à França (...) ou morrido em 1858”, escreveu. Um anúncio no Jornal do Commercio de 8 de outubro de 1864, catalogado pela pesquisadora Elaine Dias, confirma essa informação e o apreço das alunas pelo professor Desmons: “A Sra. A. Castro, diretora do colégio de meninas à sua Largo de São Joaquim no. 94, sentindo-se devidamente a morte de M. Nicolas Desmons, antigo professor em seu colégio, convida a família e colegas do mesmo finado para uma missa, que em sufrágio de sua alma manda celebrar na igreja de Nossa Senhora da Conceição, hoje 8 do corrente, as 8 horas, trigésimo dia de seu falecimento”.