As ilustrações do livro Viagem ao Brasil, escrito pelo cientista suíço Louis Agassiz (1807-1873) e sua mulher, a norte-americana Elizabeth Cary Agassiz (1822-1907), foram disponibilizadas recentemente na Brasiliana Iconográfica. O casal esteve no Brasil entre abril de 1865 e julho de 1866, em uma expedição financiada pelo empresário e banqueiro Nathaniel Thayer Jr. (1808-1883), mecenas da Universidade de Harvard, onde Agassiz dava aulas de zoologia e geologia. Ele já era um zoólogo reconhecido internacionalmente por suas pesquisas e pela descrição dos peixes coletados pelos naturalistas alemães Johann Baptist Spix (1781-1826) e Carl Friedrich Philipp Von Martius (1794-1868), durante a viagem dos dois ao Brasil entre 1817 e 1821. Após a morte precoce de Spix, Agassiz completou o seu trabalho.
Como já conhecia muitos peixes brasileiros e com o pretexto de formar uma coleção de peixes amazônicos e investigar a origem das espécies, Agassiz teve, além do patrocínio de Thayer, também o apoio de D. Pedro II (1825-1891), com quem se correspondeu antes, durante e depois da viagem. Agassiz era um "inimigo científico" do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), os dois estavam em campos opostos quanto à origem e evolução das espécies. O cientista suíço, que era ligado à igreja e defendia teorias mais conservadoras, pretendia, com seus estudos no Brasil, provar que o inglês estava errado, mas não conseguiu.
"As concepções de Agassiz diferiam radicalmente das teorias da evolução pela seleção natural defendidas por Darwin. O zoólogo suíço insistia em argumentar a partir da vontade do Criador e de sua constante intervenção no mundo. Para Darwin e os evolucionistas, a intervenção de Deus se limitaria ao sopro inicial da vida na Terra. (...) O livro A Origem das espécies de Darwin foi publicado em 1859. No início da década de 1860, diversos naturalistas começavam a aderir ao evolucionismo darwinista. (...) Agassiz, embora tivesse amplo reconhecimento intelectual por parte das autoridades norte-americanas e do grande público, começava a ser questionado por jovens naturalistas americanos, que rejeitavam suas interpretações, julgadas por demais teológicas, além de criticarem suas concepções racistas. Foi nesse contexto que surgiu para Agassiz a possibilidade de empreender uma expedição científica à Amazônia, espécie de Terra Prometida dos ictiólogos. Com a publicidade garantida por tal viagem, as observações geológicas e o material coletado nessa imensa região, o zoólogo acreditava poder obter fortes aliados para rebater as ideias evolucionistas e defender a fixidez das espécies e as criações sucessivas", escreveu a pesquisadora Lorelai B. Kury, em seu artigo A sereia amazônica dos Agassiz: zoologia e racismo na Viagem ao Brasil (Revista Brasileira de História, vol. 21, número 41, Associação Nacional de História, São Paulo, 2001).
A Expedição Thayer começou no Rio de Janeiro, passou por Minas Gerais e chegou ao Amazonas. O casal veio acompanhado por seis funcionários do Museu de Zoologia Comparada de Harvard, que Agassiz havia fundado em 1859, entre eles um ornitólogo, um especialista em moluscos, um geólogo, um paleontólogo e um ilustrador. O livro Viagem ao Brasil, publicado em 1868 nos Estados Unidos, foi escrito por Elizabeth Agassiz, como um diário de viagem, em linguagem mais acessível, e seu marido contribuiu com notas científicas e trechos de correspondências e palestras que fez durante a viagem para esclarecer os conceitos que queria defender.
Agassiz se mudou para os Estados Unidos em 1846 e, a partir do seu contato com os negros no novo país, se tornou cada vez mais racista, acreditando que a espécie humana, assim como, na sua concepção, a dos animais, não era uma só e que a miscigenação era algo a ser combatido. "Por mim, julgo estar demonstrado que, a não ser que se prove que as diferenças existentes entre as raças índia, negra e branca são instáveis e passageiras, não se pode, sem estar em desacordo com os fatos, afirmar a comunidade de origem para todas as variedades da família humana", escreveu o cientista (Viagem ao Brasil, Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1975). No Rio de Janeiro e em Manaus, Agassiz se dedicou também a fazer registros fotográficos de pessoas de origem africana, indígena ou de seus descendentes miscigenados. Algumas gravuras feitas a partir dessas fotografias podem ser vistas nesta edição francesa, de 1872, como a do jovem acima e a mulher abaixo, os dois filhos de branco e indígena, ou "mammalucos", como são chamados no livro. Para Agassiz, "aqueles que põem em dúvida os efeitos perniciosos da mistura de raças e são levados por falsa filantropia, a romper todas as barreiras colocadas entre elas, deveriam vir ao Brasil".
Agassiz não obteve o sucesso esperado na sua empreitada. Ao voltar aos Estados Unidos, com cerca de 8 mil materiais coletados, centenas de aquarelas de peixes e publicar alguns artigos científicos, não encontrou a recepção esperada às fotografias, que não foram divulgadas e ficaram conservadas junto com todo o material no Museu de Zoologia Comparada da Universidade de Harvard. Muitas dessas fotografias mostravam homens e mulheres nus, de frente, de costas e de lado, com pretensão de serem um estudo antropológico. Criticadas, foram convenientemente esquecidas e transferidas para o arquivo do Peabody Museum, da mesma universidade, em 1935.